No contexto da crise da arte, da crise ecológica, da crise da democracia, da crise do humanismo, essa exposição busca espaços do ainda: ainda arte, ainda democracia, ainda humanos.

A pesquisa parte de reflexões da artista carioca Lygia Clark, tendo como referência a filósofa Judith Butler, estímulo que auxilia pensar concretamente no que percebo materializado na arte desde os anos 1960.

Nessa época, Lygia Clark usou o termo precariedade para descrever o ato artístico incerto e imprevisível, bem como a condição da existência, a vulnerabilidade, a abertura em relação ao outro. Nos anos 1970, a precariedade se mantém como problema na arte, articulado ao uso de material não artístico apropriado do cotidiano.

O que me interessa nessas reflexões da artista são as pistas para a consideração da condição precária da arte. Clark coloca a situação do face-a-face, do corpo-a-corpo entre duas entidades vivas, vulneráveis, uma reverberando na outra a diferença, o estranhamento, a dessemelhança, a dependência. No espaço contínuo e reversível entre interioridade e exterioridade, entre o eu e o outro, a precariedade promove a falha da linguagem triunfante, essa que reduz o estranho a alguma evidência ou significação. O reconhecimento da precariedade da existência faz a linguagem gaguejar, tornando-se presença incerta de imagens múltiplas.

A exposição Espaços do Ainda é resultado de um projeto de pesquisa sobre as relações entre arte e precariedade desenvolvido na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) em parceria com o Arquivo Nacional. A pesquisa teve início com o colóquio Vidas Precárias: A Experiência da Arte na Esfera Pública, cujas conferências foram reunidas em livro homônimo. Demos continuidade com o programa de conversas em vídeo transmitido pelo canal do YouTube: Arte e Precariedade.

Espaços do Ainda elabora o território da vulnerabilidade, que é também o da abertura do gesto artístico à diferença, à suspensão, à falha. Quando tantas questões éticas e políticas urgentes tocam o campo da estética, que gestos podem ser ainda “artísticos” se o fora atravessa e contamina a arte? No contexto das crises que vivemos, a exposição busca reencontrar a precariedade existencial como experiência política da arte, fato ambicionado pela artista Lygia Clark já nos anos 1960.

A exposição está dividida em dois núcleos: Sob o Céu dos Anônimos e No Chão das Diferenças.

Luiz Cláudio da Costa